Luis Mauricio Bini
Professor Titular do Departamento de Ecologia, ICB,
Universidade Federal de Goiás.
Pesquisador Nível 1A do CNPq
Em um excelente artigo, o filósofo e biólogo evolutivo Massimo Pigliucci (Universidade da Cidade de Nova Iorque) ressalta a importância de três pontos para lidar com a onda crescente de negacionismo científico: logos, ethos e pathos. De acordo com o Pigliucci, em uma discussão com um negacionista, teórico da conspiração, superespalhador de notícias falsas ou adepto da pseudociência, devemos ter o logos, ou seja, o conhecimento adquirido após estudar um tema profundamente. Embora necessária, a simples apresentação de fatos (logos) pode não ser suficiente para combater o negacionismo científico (mas veja, por exemplo, Schmid & Betsch, 2018). Assim, de acordo com Pigliucci, devemos também estabelecer uma relação de confiança (ethos) e empatia (pathos) com o nosso negacionista hipotético.
A magnitude da dificuldade de combater o negacionismo pode ser entendida se fizermos um pequeno experimento, como aquele feito pelo Pigliucci. Por exemplo, você já tentou convencer um parente próximo sobre algum tema científico? Muito provavelmente você tem as três condições importantes citadas acima para combater o negacionista da família. Se você está lendo esse blog, muito provavelmente você tem uma formação universitária (logos) e como você está tentando convencer, por exemplo, sua própria mãe, também é muito provável que relações de confiança (ethos) e empatia (pathos) foram estabelecidas. E agora vem outra pergunta: você foi bem-sucedido(a)? Bom, eu já fiz esse experimento algumas vezes e, assim como Pigliucci, falhei em todas as tentativas... Provavelmente, o efeito do tiro pela culatra (“backfire effect”) pode explicar parte do nosso fracasso. Veja, por exemplo, uma das conclusões do artigo de Nyhan & Reifler (2015): “Specifically, while corrective information about the flu vaccine had no effect on vaccination intention among respondents with low side effects concern, it significantly decreased the reported likelihood of receiving a flu vaccine among those with high side effects concern.” Uma das explicações básicas para o efeito do tiro pela culatra foi descrita recentemente por Ecker, Lewandowsky & Chadwick (2020): “Some researchers have even argued that a correction should avoid repeating the misinformation, as the correction itself could serve to inadvertently enhance misinformation familiarity and may thus backfire, ironically strengthening the very misconception that it aims to correct.” Alternativamente, o nosso logos pode ser limitado e o parentesco pode não ser suficiente para garantir o ethos ou pathos. No entanto, nós não desistimos dos nossos entes queridos e de quando em quando (geralmente nessa época do ano...) tentamos novamente (sim, eu concordo que, com nossa insistência, quase que inescapavelmente, vamos criar um arranca-rabo familiar e provavelmente vamos ficar sem falar com alguns parentes, pelo menos até o próximo final de ano).
E como agimos em uma discussão com aqueles entes que não são tão queridos assim? Especialmente com aqueles que não conhecemos pessoalmente, que estão em posição de liderança e que não deveriam (moralmente e legalmente) ser negacionistas? Em geral, mesmo se mantivermos a tríade citada acima, é provável que, outra vez, vamos falhar miseravelmente. Por que? Primeiro, temos que reconhecer que eles (i.e., os entes que não são tão queridos...) são intelectualmente desonestos e sevos, mas não são ignorantes. Como explicado por Pigliucci, alguns até mesmo aprenderam a retrucar nossos argumentos apontando falsas falácias numa discussão. Por exemplo, se falamos que uma determinada desinformação, que contraria um grande conjunto de evidências acumuladas até então, está sendo propagada por uma pessoa que trabalha para uma indústria que é uma importante fonte de gases do efeito estufa, eles dizem que estamos utilizando um argumentum ad hominem. Se dizemos que um determinado estudo foi publicado numa revista predatória, eles argumentam que estamos escolhendo cerejas ou incorrendo em algum tipo "viés de confirmação". Eles também podem usar o argumento pós-modernista que o aquecimento global é uma construção social e que não existe essa coisa chamada verdade objetiva. Eles literalmente apreenderam essas estratégias com os pós-modernistas. Por exemplo, o filósofo Robert T. Pennock descreve como Phillip E. Johnson (1940-2019), na época o principal líder do movimento do "design inteligente", valeu-se, assumidamente, de ideias pós-modernistas: “The major portion of the paper will highlight the postmodern elements that are found throughout IDC writings. It will be important to see how these ideas are expressed in their own words, so I shall document this pattern with quotations from their writings and interviews, focusing mostly on those of Johnson who was the IDC leader who pioneered this new way of framing anti-evolutionism. Postmodernism played a key role in his personal mid-life crisis that led to his religious conversion, and in the ID movement he attempted to recreate the conceptual framework that led to his own rejection of evolution and acceptance of Jesus” (para um relato mais recente, ver o excelente livro do filósofo Lee McIntyre).
Ademais, negacionistas e outros mercadores da dúvida (ver o excelente livro dos historiadores Naomi Oreskes e Eric Conway) usam a já conhecida estratégia de demandar evidências impossíveis. Em geral, os combatentes do negacionismo tendem a falar de maneira respeitosa e clara, sem alteração de voz e sem hipérboles. Os negacionistas, por outro lado, tendem a ser estridentes, agressivos e ofensivos. Não raramente, padecem da síndrome de Galileu. No final da contenda, em termos de convencimento de uma parcela substancial da população, eles, aparentemente, ganham de lavada.
A inspiração acabou...vou concluir citando Carl Sagan: “You might imagine an uncharitable extraterrestrial observer looking down on our species... - with us excitedly chattering, "The Universe is created for us! We're at the center! Everything pays homage to us!" - and concluding that our pretensions are amusing, our aspirations pathetic, that this must be the planet of the idiots.”
Hoje, descobri blogalexdiniz. Tenho momentos de 'desesperança', mas tudo aqui me enche de força, de vontade de continuar lutando por um mundo mais inclusivo, principalmente, agora com essa política negacionista de um 'serviçal do capitalismo', posso ficar em casa mais calada nunca. Sempre soubemos que os direitos não são permanentes, as pandemia têm ciclos e revelam em pouco tempo se as politicas foram corretas. ... se existiu uma maioria de votos, em um momento histórico, isso também não é permanente. Entre eles, a maior parte dos eleitores já detectaram as falsas promessas, mesmo que particularmente não consiga compreenda o que não era visível. Outra parte, em torno de 20-25%, dos eleitores são escravocratas mesmo, como o 'professor' de Patos d…